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sexta-feira, 29 de março de 2013

A NATUREZA DA ALMA - Por Leibnitz

Leibnitz


A NATUREZA DA ALMA 
por Leibnitz

      O corpo orgânico de cada ser vivo é uma espécie de maquina divina ou autômata natural, que infinitamente sobreleva todos os autômatos artificiais. Porque uma máquina feita pela arte do homem não é uma maquina em cada uma das suas partes. Por exemplo, o dente duma roda de metal tem partes ou fragmentos que para nós não são produtos artificiais, e que não tem os característicos especiais do maquinismo, porque não dão indicação do fim a que a roda é destinada. Mas os maquinismos da natureza, isto é, os corpos vivos, são maquinismos mesmo nas suas mais pequenas partes "ad infinitum".  É esta a diferença entre a natureza e a arte, isto é, entre a arte divina e a nossa. É possível ao autor da natureza empregar este poder divino e infinitamente maravilhoso da arte, porque cada pedaço da matéria não só é infinitamente divisível, como notaram os antigos, mas é realmente infinitamente subdividido, cada parte em outras, cada uma das quais tem qualquer movimento próprio; de contrário seria impossível que cada pedaço da matéria expressasse o universo inteiro.
     Daqui se vê que na mínima partícula da matéria há um mundo de criaturas, seres vivos, animais, entelequias, almas. 
     Cada pedaço de matéria pode conceber-se como tal qual um jardim cheio de plantas ou um lago cheio de peixes. Mas cada ramo de cada planta, cada membro de cada animal, cada gota dos seus elementos líquidos é também outro tal jardim ou lago. 
     E conquanto a terra e o ar que estão entre as plantas do jardim, ou a água que está entre os peixes do lago, não sejam nem peixe, ainda assim também contém plantas e peixes, mas na sua maioria duma pequenez para nós imperceptível. 
     Daqui se vê que cada corpo tem uma entelequia dominante, que num animal é a alma; mas os membros deste corpo vivo estão cheios de outros corpos vivos, plantas, animais, cada um dos quais tem também a sua entelequia ou alma dominante. 
     Não se deve imaginar, como tem feito alguns que tem compreendido mal o meu pensamento, que cada alma tem uma quantidade ou porção de matéria que exclusivamente lhe pertence ou para sempre está ligada, e que por consequência é senhora de outros seres vivos e inferiores, que estão eternamente afetos ao seus serviços. Porque todos os corpos estão num fluxo perpétuo como os rios, e partes continuamente entram e saem deles. 
     Assim a alma muda de corpo apenas gradualmente,  pouco a pouco, de modo que nunca lhe faltam todos os seus órgãos; e que há muitas vezes metamorfoses nos animais, mas nunca metempsicose ou transmigração de almas; nem há almas de todo separadas (do corpo) nem espíritos sem corpo. Só Deus é completamente sem corpo. 
É por isso também, que nunca há geração absoluta nem morte completa, no sentido exato, consistindo na separação da alma. Aquilo a que chamamos gerações são desenvolvimentos e crescimentos e aquilo a que chamamos mortes são envolvimentos e diminuições. 
     Tem dado muito que fazer aos filósofos a origem das formas, entelequias ou almas; mas sabe-se hoje, pelo estudo acurado das plantas, insetos e animais, que os corpos orgânicos não são nunca produto do caos ou da putrefação, mas vem sempre de sementes onde havia sem dúvida qualquer preformação; e sustenta-se que não só o corpo orgânico estava la antes da concepção, mas também uma alma nesse corpo, em suma o próprio animal; e que por meio da concepção este animal foi simplesmente preparado para a grande transformação que envolve "o tornar-se um animal de outra espécie". É qualquer coisa neste gênero que se vê caos que não são de nascimento, quando por exemplo, larvas se tornam moscas e lagartas, borboletas...
     Estes princípios deram-me meio de explicar naturalmente a união, ou a conformidade da alma e do corpo orgânico. A Alma segue as suas próprias leis, e o corpo do mesmo modo segue as suas, e concordam um com o outro  em virtude da harmonia pré-estabelecida entre todas as substâncias, visto que são todas representações do mesmo e único universo. 
     As almas agem segundo as leis das causas finais por apetições, fins e meios. Os corpos agem segundo as leis de causas eficientes ou movimentos. E os dois reinos, o das causas eficientes e o das causas finais, são harmônicos entre si. 
     Segundo este sistema os corpos agem como se (para supor o impossível) não houvesse alma, e as almas agem como se não houvesse corpo e ambos agem como se cada um influenciasse o outro.
     Com respeito aos espíritos ou almas racionais, conquanto ache que há no fundo a mesma coisa, em todos os seres vivos e animais, como acabamos de dizer - (isto é, que os animais e a alma começam a ser quando o mundo começa e, como o mundo, não tem fim), ainda assim há esta peculiaridade  nos animais racionais, que os seus animáculos espermáticos, enquanto não são mais do que espermáticos, tem almas simplesmente ordinárias ou sensitivas; mas quando aqueles que são eleitos, para mim  dizer, atingem a natureza humana por uma concepção atual, as suas almas sensitivas sobem à altura da razão e à prerrogativa de espíritos. 
     Entre outras diferenças  que existem entre as almas ordinárias e os espíritos, diferenças das quais já tenho notado algumas, há também esta: que as almas em geral são espelhos vivos  ou imagens do universo das criaturas; mas que os espíritos são também imagens da Divindade ou do próprio autor da natureza, aptas para conhecer o sistema do universo, e até certo ponto para o imitar por meio de modelos arquitetônicos, sendo cada espírito como uma pequena divindade na sua própria esfera. 
     É isto que faz com que os espíritos possam entrar numa espécie de comunicação com Deus e faz com que se dê o caso que Ele não é só o que um inventor é para a sua máquina (a qual relação é a de Deus para com todas as outras coisas criadas), mas também o que um príncipe é para os seus súditos, e o que um pai é para os seus filhos. 
     Daqui é fácil concluir que a totalidade dos espíritos deve constituir a Cidade de Deus, quer dizer, o mais perfeito Estado que é possível sob o mais perfeito dos Monarcas.
     Esta cidade de deus, esta monarquia verdadeiramente universal, é um mundo num mundo natural, e a mais alta e mais divina entre as obras de Deus; e é nela que a glória de Deus principalmente consiste, porque Ele não teria glória se a Sua grandeza e a Sua bondade não fossem conhecidas e admiradas por espíritos. É também em relação a esta Cidade divina que Deus especialmente mostra bondade, ao passo que a Sua sabedoria e o Seu poder estão manifestados em parte.
     Assim como acima mostramos que há uma perfeita harmonia entre os dois reinos da natureza, um de causas eficientes, outro de causas finais, cumpre-nos aqui notar ainda uma outra harmonia entre o reino físico da natureza e o reino moral da graça, isto é, entre Deus, considerado como arquiteto do maquinismo do universo e Deus considerado como Monarca da divina Cidade dos espíritos. 
     Um resultado desta harmonia é que as coisas levam à graça pelos próprios caminhos da natureza, e que este globo, por exemplo, deve ser destruído e renovado por meios naturais na própria ocasião em que o governo dos espíritos o exige, para castigo de alguns e recompensa dos outros. 
     Também se pode acrescentar que Deus como Arquiteto em tudo satisfaz Deus como legislador, é assim que os "pecados" devem trazer consigo o seu próprio castigo, pela ordem natural, e mesmo em virtude da estrutura mecânica das coisas; e paralelamente que as ações devem obter as suas recompensas por vias maquinais em relação aos corpos, conquanto isto não possa nem deva acontecer sempre imediatamente. 
     Finalmente sob este governo perfeito, nenhuma boa ação ficaria sem recompensa e nenhuma má ação sem castigo, e tudo deve redundar para bem dos bons; isto é, daqueles que não são descontentes neste grande estado, que confiam na Providência, depois de ter feito o seu dever, e que amam e incitam, como é próprio, o Autor de todo o mundo da lei, tendo-se contemplação das Suas perfeições, segundo a natureza do verdadeiro "amor puro", que acha prazer na felicidade do ente amado. É isto que leva gente sábia e virtuosa a dedicar as suas energias a tudo quanto pareça em harmonia com vontade presuntiva ou antecedente de Deus, e contudo os faz contentarem-se com o que Deus realmente faz vir a ser pela sua vontade secreta, consequente e decisiva; reconhecendo que se pudéssemos conhecer suficientemente a ordem do universo, acharíamos que ele excede os desejos dos mais sábios, e que é impossível torná-lo melhor do que é, não só como um todo em geral, mas também para nós mesmos em particular, se somos dedicados, como devemos ser, ao Autor de tudo, não só como sendo o arquiteto e a causa eficiente do nosso ser, mas como sendo o nosso Senhor e causa final, que deve ser o único fim da nossa vontade, e é a única coisa que nos pode tornar felizes.
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BREVE BIOGRAFIA DE "LEIBNITZ",
   Godofredo Guilherme Leibnitz,  um dos  maiores matemáticos e  metafísicos do mundo, um gênio  universal, nasceu em 1648 em Lípsia -Alemanha -, onde seu pai era professor de filosofia. Prodígio de erudição precoce, entro aos quinze anos para a Universidade de Lípsia; ali, depois, estudou muito a história e filosofia antigas e modernas; cursou direito durante um ano em Iena; e recusando-lhe Lípsia o grau de doutor em direito por causa da sua pouca idade, concedeu-lhe Altdorf pela mesma tese, "Casos duvidosos no direito".  Indo para Frankfurt em 1697, escreveu um estudo sobre a educação jurídica que atraiu a atenção do arcebispo-eleitor de Moguncia,  que o empregou como medianeiro para tentar a união de católicos e protestantes. Em 1672 foi a Paris para induzir Luiz XIV a invadir o Egito, projeto sobre o qual escrevera um livro, e ali se demorou quatro anos, correspondendo-se com sábios de nome, inventando uma máquina de calcular, e em 1676 o cálculo diferencial. Em 1673 faleceu o arcebispo, e depois de procurar entrar para a carreira diplomática, Leibnitz vei a ser, e foi até morrer, bibliotecário do Duque de Brunswick em Hanover. Em 1703 escreveu os "Novos Ensaios sobre o Entendimento Humano", em 1710 a "Teodicéa", e em 1714 a "Monadologia". Faleceu em 1716. 
Estudo Pesquisa e postagem: Nicéas Romeo Zanchett 
http://máximas-grandespensadoresuniversais.blogspot.com.br   
  
     

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